MULHERES NA GESTÃO DE RECURSOS PESQUEIROS NA REGIÃO DO MÉDIO SOLIMÕES, AMAZÔNIA: CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE, ACESSO À RENDA E RESILIÊNCIA DA PESCA
Resumo
O artigo trata do trabalho das mulheres em projetos de gestão de recursos pesqueiros desenvolvidos em sistemas de lagos situados nas RDS Mamirauá, Amanã, e em áreas do entorno dessas unidades de conservação localizadas na região do Médio Solimões, estado
do Amazonas. Os projetos são guiados por princípios de cooperação, igualdade de participação e de equidade de gênero no acesso aos recursos pesqueiros e à renda. O objetivo do artigo é analisar as estratégias usadas pelas mulheres para participar das atividades dos projetos que são desenvolvidas ao longo do ano, como condição para que as pescadoras tenham acesso a uma cota de peixes. A organização do trabalho tem como referência o grupo familiar, onde as mulheres participam como membros de equipes mistas, realizando várias atividades que envolvem crianças e jovens, criando oportunidades de acesso a conhecimentos, desenvolvendo habilidades e técnicas necessárias para a realização da pesca do pirarucu. Argumentamos que a inclusão de uma perspectiva de gênero nos projetos não deve ser entendida como uma adequação das mulheres às normas existentes, mas em criar condições para seu empoderamento, e participarem de forma equitativa nas atividades e no acesso aos recursos e à renda. Os dados analisados resultam de pesquisas realizadas entre os anos de 2014 a 2019 com pescadoras que participam de oito projetos de manejo de pirarucus. A coleta de informações foi realizada com uso de métodos mistos, com observação de atividades, participação em reuniões, realização de entrevistas e conversas informais. Foram aplicados questionários com 130 pescadoras para elaborar um levantamento
sociodemográfico e obter dados sobre renda e tipos de investimentos. Os resultados da análise apontam que as mulheres desenvolvem estratégias para reverter restrições culturais e garantir sua participação nas atividades desenvolvidas ao longo do ano,
atuando enquanto membros de um grupo familiar ou de uma equipe de pesca formada por gênero misto, ou apenas por mulheres. A participação nas assembleias – espaços de tomada de decisão sobre o sistema de governança dos projetos – lhes permite incluir normas e critérios que garantam equidade de acesso a recursos e à renda; as mulheres investem a renda na segurança alimentar, compra de material de trabalho, na moradia e realização de um projeto familiar. Sua participação nos projetos dá visibilidade ao seu
trabalho na pesca, cria condições para a socialização das novas gerações de pescadores e pescadoras, e contribui para a conservação da biodiversidade e resiliencia da pesca.
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